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Mais de 17% dos portugueses encontram-se em risco de pobreza

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Mais de 12% da população portuguesa estava em 2019 numa situação de pobreza persistente e 17,2% em risco de pobreza, uma percentagem que disparava para mais de 43% sem apoios sociais do Estado, segundo um estudo hoje divulgado.

Os dados constam do relatório “Portugal, Balanço Social 2020 – Um retrato do país e dos efeitos da pandemia”, da faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa, a NOVA SBE.

O relatório foi produzido pela economista e professora da instituição, Susana Peralta, em coautoria com Bruno P. Carvalho e Mariana Esteves, e é hoje apresentado publicamente.

Numa primeira parte faz um retrato estatístico da situação socioeconómica das famílias centrado no período entre 2016 e 2019, mas focando-se sobretudo nos anos de 2018 e 2019.

O retrato estatístico tem por base os dados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento, aplicado em Portugal, anualmente, pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), mas usado pelo Eurostat para fins de comparabilidade europeia de indicadores de coesão social.

Ressalvando a interrupção provocada pelo período de assistência externa a Portugal, o relatório aponta a tendência de queda da taxa de risco de pobreza no país ao longo da última década, mas a percentagem era ainda de 17,2% em 2019, acima da média da União Europeia a 27, mas seria muito superior sem apoios do Estado.

“As transferências sociais são importantes instrumentos para reduzir a pobreza. Em 2019, a proporção de pessoas em situação de pobreza, antes de transferências sociais, era de 43,4%”, aponta-se no relatório.

Em declarações à Lusa, Susana Peralta sublinhou a ligação da pobreza aos salários baixos, o que é a realidade em Portugal, assim como a relação com o mercado de trabalho.

De acordo com o relatório “os desempregados são o grupo com maior taxa de pobreza em 2019 (42%)” e “trabalhar a tempo inteiro também não é garantia de sair da situação de pobreza – 46% da população pobre vive em agregados onde os adultos trabalham mais de 85% do tempo, ou seja, praticamente a tempo inteiro”, acrescentando que além dos desempregados, a pobreza é também mais prevalente entre as famílias monoparentais e os indivíduos com níveis de escolaridade mais baixos”.

“Portugal sendo um país de salários baixos e com um nível de precariedade do mercado de trabalho dos mais elevados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) faz com que as pessoas tenham relações com o mercado de trabalho que não a protegem da pobreza”, disse Susana Peralta.

A economista apontou o exemplo dos trabalhadores independentes, os chamados ‘recibos verdes’, e dos trabalhadores a tempo parcial como parte importante nos números da pobreza entre quem trabalha, auferindo rendimentos inferiores ao Salário Mínimo Nacional, um referencial de rendimentos acima do limiar da pobreza.

É preciso ainda ter em conta o peso de dependentes sem rendimentos no agregado familiar, como as crianças, e de desempregados, o que se reflete noutro indicador, o da intensidade laboral, que avalia o tempo de trabalho a tempo inteiro dos adultos num agregado familiar.

O relatório refere que “a proporção de agregados onde os adultos entre 18 e 59 anos trabalham menos de 20% do tempo, isto é, a percentagem de pessoas com muito baixa intensidade laboral aumentou entre 2008 e 2014. Neste ano atingiu um máximo de cerca de 12%, tendo regressado aos níveis pré-crise em 2019, quando se cifrou em cerca de 6%”.

O relatório retrata ainda a evolução da situação de pobreza persistente em Portugal: em 2019 era de 12,5% para a população em geral, de 11% para as crianças, de 8% para os trabalhadores e de mais de 33% para os desempregados.

Entre 2016 e 2019 quase 60% dos desempregados estiveram numa situação de pobreza pelo menos durante um ano, uma situação que afetou 36,5% de crianças e 25,1% de trabalhadores. No geral, a taxa fixou-se nos 31,2%.

A taxa de privação material, que mede a capacidade de as pessoas conseguirem fazer face a despesas inesperadas, de pagar uma semana de férias por ano fora de casa, ou conseguir manter a casa aquecida, entre outros indicadores, fixou-se em 2019 nos 15,1%, depois de já ter estado nos 23% na década anterior, em 2008. A taxa de privação material severa caiu, no mesmo período, de 9,7% para 5,6%.

“Entre 2008 e 2019 aumentou o número de pessoas que afirma não ter capacidade de assegurar o pagamento imediato de uma despesa sem recorrer a um empréstimo. Para a população em risco de pobreza este valor subiu de 47% para 64%”, adianta o relatório.

Aumentou ainda o hiato da pobreza, ou seja, a distância entre os rendimentos de um agregado familiar e o valor do limiar da pobreza, passando de 2,1% em 2008 para 2,3% em 2019. No ano passado o limiar de pobreza era de 6.014 euros anuais, mais 1.045 euros do que em 2008.

A pobreza tem reflexos no acesso e qualidade da saúde, com quase 25% das pessoas em situação de pobreza a avaliarem como má a sua saúde e a reportarem maiores dificuldades de acesso a cuidados de medicina dentária, não disponível no Serviço Nacional de Saúde.

As carências habitacionais entre a população pobre eram em 2019 de 26%, o dobro face à população geral. São também os mais pobres os que mais vivem em alojamentos sobrelotados (18%) e os que mais consideram excessivos os custos com a habitação: “38% dos agregados pobres em Portugal têm encargos com a habitação que excedem 40% do rendimento do agregado (face a 16% da população total)”.

O relatório aponta ainda que a pobreza cria desigualdades na participação cívica e democrática, o que “pode reduzir a representatividade dos interesses dos cidadãos nas escolhas políticas” acrescentando que “a proporção de pessoas mais pobres que não manifesta, ou manifesta pouco, interesse por política é de 60%, o dobro da proporção entre os mais ricos”.

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